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Adonay Anthony Evans - Engenheiro Agrônomo, formado pela Escola Superior de Agricultura Luíz de Queiróz ESALQ - Universidade de São Paulo USP

Em Mesa (quase) Redonda o Jornal da Cerveja reúne especialistas em torno de um tema. Neste número, o Jornal da Cerveja aprofunda o tema :



Qualidade do Malte na produção de uma grande cerveja





As perguntas foram respondidas, por: 







 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

AS INFORMAÇÕES QUE UMA FICHA DE MALTE NOS DÁ

 

Se você não souber ler uma Ficha de Análise do Malte, esqueça; você nunca vai poder fazer cerveja. Na verdade não deveria mesmo nem poder beber...


Estamos pensando em contratar um lobista para fazer passar uma lei no Congresso “proibindo o consumo de cerveja em todo o Território Nacional por pessoas não habilitadas na leitura e interpretação de uma ficha de análise de malte.”


A Ficha de Análise do Malte, é a radiografia do bicho.


Para discutir cada parâmetro de uma ficha de análise de malte, convidamos especialistas para constituir esse STM (Superior Tribunal do Malte). Abaixo, aí vai a jurisprudência:

 

 

Jornal da Cerveja:



  1. O que é Extrato, quais seus limites e qual sua influencia na brassagem? 

 

Tschope: O malte moído é submetido a um processo padrão ou standard de mosturação (Kongressmaichverfahren) normatizado pela EBC (European Brewery Convention) e que como tal, possibilita comparações de resultados em diferentes amostras de malte. No mosto obtido por este processo, efetuam-se várias determinações analíticas cujos valores são de grande importância para o processo de fabricação da cerveja. Durante a mosturação, o amido presente no malte é solubilizado em açúcares fermentescíveis que darão origem a CO2 e álcool durante a fermentação. A quantidade de açúcares formada é determinada pelo extrato que juntamente com o teor protéico e sua dissolução, forma o “corpo” da cerveja. Além disso, o valor do rendimento é um subsídio para negociar a aquisição do malte. O extrato do mosto (Plato), é a fração solubilizada, composta basicamente de açúcares, dextrinas, proteínas, aminoácidos, polifenóis e minerais presentes no mosto, resultante da degradação enzimática da matéria-prima. O extrato da amostra (Rendimento) é o potencial do malte para preparação do mosto.



Evans

O Extrato em água quente Hot Water Extract (HWT) ou simplesmente Extrato de Malte Malt Extract (ME), como aparece em algumas fichas, representa a quantidade de açúcares fermentáveis ou não, e outros sólidos (proteínas, aminas e amidas, lipídeos, minerais, etc.) que se pode obter a partir do grão de malte. Como se sabe, a planta de cevada transforma a energia do sol na forma de radiação através da fotossíntese em forma de energia química e armazena nos grãos em moléculas de amido. As moléculas de amido podem possuir cadeias longas com até mais de 1.400 moléculas de radical glicose, impossível de serem metabolizadas pelo fermento, seja na sua fase de reprodução, seja na fase de fermentação. A mostura constitui a forma de quebrar essas longas cadeias em moléculas menores passíveis de metabolização pelo fermento, como glucose (1 molécula) e fundamentalmente maltose (duas moléculas de glicose). A qualidade do extrato, e consequentemente do mosto e seu rendimento, é o resultado de 4 fatores:

1.  da variedade da cevada (2 ou 6 fileiras, espessura da casca do grão, tamanho do grão, conteúdo de proteína, amido, outros polissacarídeos que não o amido, e quantidade e qualidade das enzimas responsáveis pela modificação da cevada em malte -poder diastático)
2. Do meio ambiente (disponibilidade de água e umidade do ar durante o crescimento da planta, principalmente no momento de formação dos grãos, temperatura, fertilidade do solo ou fertilizantes, em especial disponibilidade de nitrogênio).
3. Do processo de malteação influenciando (grau de modificação do amido em glucose-maltose, qualidade final da cerveja, corpo, turbidez e espuma). O nível de extrato do bom malte deve ser tão alto quanto possível, com grau de modificação de proteína (quebra das cadeias) abaixo de 50%.
4. Do processo de mostura,, como pH, tempo e temperatura de mostura, relação malte/água,

 



2. O que é Diferença de Extrato, quais seus limites e qual sua influência na brassagem?

 

 

 

Tschope: 

A moagem do malte se processa em moinhos apropriados, que trituram o malte sem moê-lo completamente.  A moagem é feita para favorecer o contato da água com o malte, a fim de que as enzimas ativadas na malteação entrem logo em ação, dissolvendo os componentes solúveis do malte.  O malte moído é submetido ao processo padrão ou standard de mosturação (Kongressmaichverfahren) normatizado pela EBC (European Brewery Convention) e seu valor é o que mais se aproxima da moagem da fábrica, sendo então usada como base de rendimento da mostura.  Para a farinha grossa, o porcentual de cascas intactas é maior, formando uma camada de filtração mais significativa tornando-a mais lenta.  O rendimento é obtido pelo percentual em extrato dado por um malte moído em determinadas condições, na elaboração do mosto. O rendimento encontrado na análise de malte é influenciado desde a variedade da cevada que se utiliza (2 ou 6 fileiras), passando pelo processo de malteação com a formação e a preservação das enzimas pelo teor de materiais que não contribuem para a obtenção de substâncias solúveis (por exemplo teor de cascas).  É medido em duas situações: nas farinhas grossa e fina, cuja determinação está no tipo de moagem grossa ou fina do malte. O valor do extrato em % plato se faz por leitura direta (densímetro) ou sacarômetro, podendo ainda ser usado um aerômetro ou picnômetro. O valor obtido na leitura, combinado ao valor da umidade do malte numa fórmula matemática, permite achar a diferença do rendimento entre as farinhas grossa e fina tanto na amostra tal qual como na amostra seca.  A diferença de rendimento entre as farinhas grossa e fina é um dado muito importante pois generaliza a solubilidade do corpo farinhoso, ou seja, a solubilização citolítica que sendo deficiente fornece na moagem grossa, uma maior quantidade de farinha grossa, de conteúdo enzimático pobre, comprometendo dessa forma o rendimento. Ao contrário, maltes bem solubilizados originam na moagem grossa um maior conteúdo em farinha fina, enzimaticamente mais rica fornecendo um melhor rendimento.  O valor dessa diferença possibilita uma avaliação da intensidade da dissolução citolítica do malte, quanto menor for essa diferença tanto melhor será a solubilidade do malte com conseqüente aumento do rendimento, do grau de fermentação completa, da filtrabilidade e diminuição da viscosidade.


Evans: 

A EBC e a ASBC, respectivamente (European Brewing Comission e American Society of Brewing Chemists) tem diferentes indices de medição de extratos. Em resumo, é medido o extrato total, estabelecido em condições ótimas de laboratório em um moinho de 2 discos ranhurados sendo um fixo e um móvel com a moagem de amostra de malte ajustada para 0% de umidade. O valor obtido de Extrato % DBFG -dry basis, fine grind – (base seca moagem fina) indica o valor solúvel máximo desse malte. O valor de 78% é considerado mínimo para o padrão de aceitação. Enquanto esse índice é uma medida da qualidade do grão, o índice Extrato% DBCG – dry basis coarse grind – (base seca moagem grosseira) indica de forma mais aproximada o grau de modificação do malte, e o resultado a se esperar na brasagem, por segurança considere entre 5 e15% de quantidade adicional na primeira brasagem que fizer com esse malte, podendo corrigir o teor de extrato com diluição se for o caso.





3. O que é Poder Diastático, o que significa a sigla WK, em que unidade é medido, e quais seus valores mínimos?



Tschope: 

O poder diastático representa a quantidade de maltose, expressa em gramas, que é formada por 100 g de malte, a partir de uma solução de amido em condições padronizadas.  A determinação do poder diastático tem por finalidade medir a atividade combinada da a (alfa) e b (beta) amilases do malte, enzimas fundamentais ao desdobramento do amido durante o processo de mosturação.  Quanto maior o poder diastático, maior a quantidade de amilases e mais eficiente será o trabalho da mosturação.


Evans:
 

O poder diastático é a quantidade e qualidade das enzimas presentes em um grão de cereal capazes de transformar o amido em maltose/glicose e dextrinas fermentáveis, e as proteínas em aminoácidos mediante a quebra das cadeias longas, sem as quais os fermentos não conseguem a metabolização necessária para  reprodução e fermentação. Os índices que medem esse poder são o grau Lintner e o  grau WK Windisch-Kolbach.



 

 

 

 

 

 

 


A fórmula de conversão de º Lintner para º WK é:


ºWK = 3,5 X º Lintner - 16





4.O que é tempo de sacarificação, qual deve ser seu tempo máximo, e quais os valores médios para um bom malte?



Tschope: 

O desdobramento do amido, durante o processo de mosturação, ocorre pelo complexo enzimático que é fornecido pelo malte, sobretudo as enzimas alfa e beta amilases. Este desdobramento tem como conseqüência a formação de açúcares fermentescíveis (principalmente maltose e glucose) e dextrinas de baixo e/ou alto peso molecular.  A sacarificação pode, entretanto, não atingir o estágio desejado devido às más condições do malte que, associado a outras deficiências no processo produtivo resulta em problemas tais como:

·                         Fermentação: face à menor quantidade de açúcares fermentescíveis presentes;

·                         Maturação: tendendo ao aparecimento do gosto de fermento;

·                         Contaminação por microorganismos: principalmente por Pediococus;

·                         Dificuldades de filtração;

·                         Estabilidade físico-química;

·                         Estabilidade organoléptica.

              O controle da sacarificação é feito através da reação entre o amido e demais produtos do desdobramento, com o iodo.  O matiz da coloração do complexo amido-iodo depende do estágio que se encontra a mosturação. O tempo da sacarificação é medido inicialmente a 10 minutos da adição de água destilada à 70ºC, sendo então repetido a intervalos regulares de 5 em 5 minutos. Uma reação de azul mais intenso indica que a sacarificação ainda não começou e, uma coloração amarela indica o seu final. Caso a sacarificação não esteja completa até 1 hora de mosturação, parar o teste.

Evans:

É uma consequência do poder diastático, e assim como o grau WK indica esse poder de conversão de malte em açúcares pela ação das enzimas em temperatura e hidratação adequadas. Em geral deve ser inferior a 10 minutos para a maioria dos maltes, e inferior a 5 minutos para maltes americanos. A portaria nº 166 do MAPA (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento) define tempo máximo de 15 minutos para Malte Pilsen e 20 minutos para Malte Munique.





5. O que são proteínas totais, quais seus valores máximos, e como valores altos influenciam na qualidade do mosto e da cerveja?



 

Tschope:

A parcela de nitrogênio total do mosto, diretamente relacionado à parcela solúvel e não solúvel, depende fundamentalmente de fatores como a qualidade e composição das matérias primas, a ação das enzimas proteolíticas, e o processo de fabricação do mosto. Quanto maior a atividade das enzimas proteolíticas durante a malteação tanto maior será o valor do nitrogênio solúvel. Este por sua vez, tem relação direta com as frações protéicas de baixo peso molecular que são necessárias à nutrição do fermento, de forma que, quanto maior o valor do nitrogênio solúvel (independentemente do nitrogênio total) tanto maior será a porção nitrogenada de baixo peso molecular disponível no mosto.  A determinação do teor de nitrogênio total pode ser utilizada também, como parâmetro de controle da mosturação e fervura, além de fornecer subsídios sobre a estabilidade físico-química e estabilidade da espuma da cerveja resultante.  As proteínas são polímeros de alto peso molecular e grande número de alfa-aminoácidos unidos uns aos outros através de ligações peptídicas, isto é, da junção do grupo carboxila de um com o grupo amina de outro, com a perda de uma molécula de água.  A importância das proteínas reside no fato de serem elas componentes fundamentais de todas as estruturas dos seres vivos, sejam estas estruturas microscópicas, submicroscópica ou macroscópicas. Além disso, algumas funcionam como enzimas, tomando parte no desenvolvimento  e controle das reações químicas celulares. Toda proteína que funciona como catalisador recebe o nome de enzima, diastase ou fermento.  As proteínas do malte têm um papel significativo, pois desempenham influências múltiplas sobre o processo tecnológico e a qualidade da cerveja, como a nutrição do fermento, a formação da espuma e do “corpo” da cerveja e as estabilidades físico-química e organoléptica da mesma.  O teor de proteínas no malte é determinado grandemente pelas proteínas da cevada as quais variam em função da espécie e variedade da planta, solo, tipo de adubação, época de plantio e condições climáticas. Durante a malteação, com a ativação enzimática, uma pequena parte destas proteínas é fracionada em peptídeos e aminoácidos enquanto que outra pequena parte é consumida no metabolismo do embrião. A quase totalidade das proteínas entretanto, permanece no malte e sofrerá ação enzimática na mosturação. As determinações de nitrogênio e proteínas são feitas pelo método Kjeldahl cujo princípio baseia-se na separação do nitrogênio na presença de ácido sulfúrico. Após adição de hidróxido de sódio, a mistura é destilada sobre uma solução de ácido bórico, formando-se borato de amônio que depois é titulado com ácido sulfúrico. O procedimento permite encontrar o valor de nitrogênio total que multiplicado por 6,25 fornece o conteúdo total de proteínas. O fator 6,25 surge em virtude da participação do nitrogênio nas proteínas do malte, que é de 16%.



Evans:

Proteínas totais inclui as formas solúveis e insolúveis. Pode ser representado como % de proteína, ou % de nitrogênio, sendo que %Proteína = 6,25 X % de Nitrogênio. Valores acima de 12% para proteína total ou 1,9% de Nitrogênio podem provocar turbidez e decantação de resíduos. O MAPA (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento), na portaria nº 166 estabelece o valor máximo de 11,5% para proteínas totais em Malte Pilsen e 12,5 em Malte Munique.







6. O que é índice de Kolbach (KZ), quais seus valores máximos e qual sua influência na qualidade do mosto e da cerveja?



Tschope:

Índice de Kolbach também conhecido como “grau de solubilização protéica” consiste no percentual de participação do nitrogênio solubilizado no mosto, sobre o nitrogênio total do malte. Este valor tem significado maior que o do nitrogênio solúvel, na avaliação da solubilização protéica, uma vez que, dois maltes com diferentes graus de dissolução proteolítica podem ter valores similares de nitrogênio solúvel.



Evans:

O índice de Kolbach, KZ é a relação entre a quantidade de proteína solúvel e a quantidade total de proteínas no malte. É um dos parâmetros que indica o grau de modificação do malte. Maltes excessivamente modificados, acima de  45 KZ podem representar aumento na perda de malte com menor rendimento na brasagem. Os valores típicos de KZ estão entre 38 e 45, com média de 40,5. O limite máximo de 45 KZ está definido na portaria nº 166 do MAPA (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento).







7. O que é índice de Hartong (VZ 45º C), quais seus valores mínimos e qual sua influência na qualidade do mosto e da cerveja?



Tschope:

O índice de Hartong é um parâmetro que permite avaliar a atividade enzimática e a solubilização protéica do malte, bem como formalizar conclusões a respeito das condições de malteação.  O método consiste em efetuar mosturações na temperatura de 20, 45, 65 e 80ºC, propiciando assim, condições ótimas para ação de cada um dos grupos componentes do pool enzimático. A partir do extrato obtido em cada uma destas mosturações, obtém-se informações específicas, quais sejam: 



·                         Valor VZ-20ºC: fornece informações a respeito da qualidade da cevada, o trabalho de molhamento, a condução do plantio e quantidade de extrato obtido na malteação.



·                         Valor VZ-45ºC: fornece informações sobre o trabalho de molhamento e moagem, a atividade das enzimas, com exceção das alfas-amilases, solubilidade dos amino ácidos e substrato para fermentação.



·                         Valor VZ-65ºC: fornece informações a respeito da dissolução citolítica e a qualidade da cevada.

·                         Valor VZ-80ºC: fornece informações a respeito da mosturação em geral, processos de filtração e cozimento.


            Comumente determina-se apenas o valor relativo a 45ºC, por ser mais significativo, pois é o extrato que se consegue extrair nessa temperatura, o qual reproduz grande parte da atividade enzimática, exceção feita às alfas-amilases.



Evans:

O grau ou índice de Hartong (VZ 45º C), é outra forma de criar a referência entre diferença de extratos, os valores mínimos de 38 (Moagem fina/Moagem grosseira) estão definidos na portaria nº do MAPA (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento). Os efeitos no mosto estão relacionados a rendimento de cozinha e corpo de cerveja, quanto menor o valor do índice de Hartong maior a quantidade de malte ou menor o corpo da cerveja para uma mesma quantidade de malte.




Egon Carlos Tschope - Mestre em Cervejas e Maltes pela Doemens Fachademie für Brauwesen und Getränketechinik Industrie-und Handelskammer für München und Oberbayern. Ex-coordenador do Curso de Cervejaria do SENAI de Vassouras-RJ

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